terça-feira, 4 de outubro de 2011

GINZBURG, Carlo. Mitos emblemas indícios - Morfologia e história. Verdier/Poche, Paris, 2010.

GINZBURG, Carlo. Mitos emblemas indícios - Morfologia e história. Verdier/Poche, Paris, 2010.

Prefácio

Relação entre ''morfologia'' e ''história'' como o fio condutor (ao menos parcial), de toda a série.

Cruzamento entre populismo e crítica estilística como fundo de suas primeiras pesquisas, a começar pelo ensaio ''Sorcellerie et piétépopulaire''.

''A hermenêutica aplicada aos textos literários e, mais especificamente, o gosto pelo detalhe revelador, orientaram profundamente meu trabalho posterior, que se embase em uma documentação de todo um outro gênero'' (GINZBURG, p.10). Entre os motivos de ter estudado os processos de bruxas está o desejo de demonstrar que um fenómeno irracional e (segundo algúns) atemporal, portanto sem importância história, poderia ser objeto de uma análise histórica racional mas não racionalista.

Hipótese final do texto sobre a bruxaria vê o processo de bruxaria como um choque entre culturas distintas. ''reconstruir uma cultura profundamente diferente da nossa era então possível, apesar do filtro imposto pelos inquisitores'' (idem, p. 11).

retomando uma argumentação formulada por March Bloch em Os reis taumaturgos, leitura decisível para Ginzburg, ele opõe uma comparação tipológica entre fenómenos históricos independentes, de um lado, e uma comparação mais propriamente histórica, de outro, e por fim escolhe esta última.

Influência diagramática proveniente de LS.

No ensaio ''De A. Warburg à E.H. Gombrich'': ''meu esforço por me situar em relação a tradição inspirada por esse [Warburg] me levaram a refletir não apenas sobre a utilisação de testemunhos figurados como fonte histórica, mas também sobre a permanência de formas e de fórmulas para além do contexto no qual nasceram'' (idem, p.12).

Demonstrando a importância de fenômenos aparentemente negligenciáveis, era indispensável recorrer a instrumentos de observação e de entrevista diferentes daqueles que utilizamos habitualmente. De uma reflexão sobre a análise aproximada, do tipo microscópico, nasceu ''Traces'' (=spies, índices).

''O que aproxima mitos e quadros (e em general obras de artes), é,de uma parte, seu nascimento e sua transmissão em contextos culturais e sociais específicos; de outro, sua dimensão formal. Que este possa ser explicado por uma análise do contexto, isso é evidente (salvo aos formalistas puros): as referências implícitas nos textos literários, e nas reações do público nos ajudam, por exemplo, a melhor compreender as pinturas eróticas de Titien'' (Titien, Ovídeo e os códigos da representação erótica no século XVI). (idem, p. 16)

Ginzburg faz mea culpa pela utilização aparentemente pacífica entre análise formal e enquete histórica. Qual delas seria, em última análise, a mais forte do ponto de vista da interpretação, se pergunta Ginzburg. ''A documentação que acumulei parecia me levar a uma escolha entre uma ligação histórica que eu não chegava a demonstrar e uma relação puramente formal que conseguia me convencer'' (idem, p. 16).

se dá conta que em suas pesquisas sobre o Sabbá tem utilizado um método muito mais morfológico que histórico. Aproximava mitos e crenças provenientes de meios culturais distintos a partir de afinidades formais [influência lévistraussiana?]. Para além das identificações superficiais, Ginzburg acredita ter reconhecido homologias profundas.

'' Eu utilisei a morfologia como uma sonda, para explorar uma camada que não podemos atingir com instrumentos de conhecimento habituais da história'' (idem, p. 18) [aparentemente uma influência estruturalista de Lévi-Strauss – vide geologia].

Se sente próximo de Propp, que considera ''a análise morfológica como um instrumento para a análise histórica, e não como uma alternativa a esta'' (idem, p. 18).

Transmissão histórica de mitos, sobretudo no que se refere ao núcleo mítico do sabbá, conservado por séculos, o afasta da ideia de inconciente coletivo, de Freud, e mais ainda dos arquétipos, de Jung (como podemos ver no capítulo dedicado a reinterpretação de um dos casos de Freud)

De ª Warburg à E. H. Gombrich: notas sobre um problema de método

tentativa de mostrar ao leitor não especialista a possibilidade de se informar dos problemas e métodos de Aby Warburg e do grupo de pesquisadores que se dizem por ele influenciados.

Para falar de ''método warburguiano'' devemos estar de acordo sobres suas características e de que maneira sua obra foi continuada por seus sucessores. Foco da discussão metodológica: utilização de testemunhos icônicos como fontes históricas.

I.

Em seu ensaio sobre o quattrocento florentino, Warburg descobre que os artistas do período ''se referiam invariavelmente, para a representação do movimento, às obras da antiguidade clássica e ele aprrondou esta ideia em seus ensaios seguintes'' (idem, p. 62). Utilização das formas antigas na representação da vida em movimento servindo à expressão exagerada do corpo e da alma. Para Warburg, a antiguidade buscada pelo quatroccento não era uma antiguidade apolínea, mas impregnada de um ''pathos dionisíaco''

representações dos mitos vindos da Antiguidade considerados como ''testemunhas de estados da alma que se tornaram imagens'' (citação de Warburg); no qual as gerações seguintes buscariam os traços mais profundos do ser humano. ; mímica e gestos como indícios das paixões violentas vivenciadas no passado.

Problema de warburg: significação que a arte antiga teve no quattrocento da sociedade florentina. Para resolver esse problema, Warbur se serve de uma documentação variada e aparentemente heterogênea: testamentos, letras de marchands, divisas amorosas, tapeçaria, quadros célebres e desconhecidos. ''Warburg queria assim reconstituir a relação existente entre as imagens e exigências práticas, os gostos, a mentalidade de uma sociedade particular – a de Florença durante a segunda parte do Quattrocento'' (p. 65).

Não podemos dizer que todo o método de Warburg leve à análise iconológica1 nem mesmo que esta última tenha a seus olhos valor preponderante. Seus interesses eram mais largos. ''Como escreve Bing, os problemas que contavam sobretudo para Warburg eram ''a função da criação figurativa na vida da civilisação [e a] relação variavel que existe entre expressão figurativa e linguagem falada. Todos os outros temas que são considerados como caracteristicos de suas pesquisas, seu interesse pelo conteúdo das representações, sua atenção para a sobrevivência da Antiguidade, não eram tanto os objetivos no senso próprio que meios para atingir esse fim''''. (BING por Ginzbourg, p. 67).

II.

Obra de Warburg então aparece de uma parte fragmentada e inacabada e de outra uma dispersão temática, ligada a um núcleo de problemas bem precisos. Dupla característica demonstram duas tendências opostas de Warburg. Warburg: oposição à fundação de uma história ''autônoma'' da arte. Cultura, para Warburg, num sentido quase antropológico: atividades manuais e superstições com o mesmo título que a arte, a literatura, a filosofia, a ciência. Essa unidade dos diversos aspectos culturais havia sido pensada já por Dilthey.

De um lado, Wind tentava sistematizar os postulados teóricos e conceituais de Warburg,do outro, Saxl, insistia sobretudo nos resultados concretos obtidos pelo pesquisador.

Saxl vê o homem do começo da Renascença, tal como pintado por Warburg, como tipo, com contradições e polaridades bem salientadas por Warburg> entre cristianismo e paganismo, D'us e Fortuna, naturalismo ''à la frainçaise'' e estilo idealizado à la antiga.

Warburg tinha ressaltado que a adoção do pathosformeln da Antiguidade por artistas da Renascença implicava uma ruptura com a arte e com toda a mentalidade medieval; nascimento de uma consciência histórica distinta entre presente e passado e fundação de uma consciência modena. (p. 73).

Ou seja, a partir de uma questão própria à história da arte, Panofsky e Saxl se interrogam sobre o problema histórico geral da significação do Renascimento, problema iluminado pela descobnerta da dimensão histórica.

III.

Para Garin, as características essenciais do ''método warburguiano'' seria: caráter concreto e precisão filológica, adesão às coisas (refusa de postulados teóricos e generalizações teóricas abstratas), abordagem interdisciplinar e ruptura de separações acadêmicas ou tradicionais.

Saxl reprende Gentile por não ter situado histórica e contextualmente seus temas. Trata-se de uma oposição que Saxl faz, implicitaemente, entre ''de um lado o filósofo que apenas vê as ideias fora dos contextos em que nascem, de outro o historiador-filólogo que não sobrepõe nenhuma teoria aos fatos, mas se limita a eles. Emboras as coisas não se passam realmente assim'' (idem, p. 80).

Saxl se pergunta, porém, sobre o significado do recurso ao mito clássico. Deveríamos, segundo ele, buscar a respostas em uma ''característica essencial à mentalidade da Renascença'' (saxl apud ginzburg, p. 81). Eles consideram suas próprias ações como pertencentes à esfera do classicismo e da universalidade que eles não poderiam encontrar uma expressão apropriada senão no mito antigo. Saxl retoma então a questão central de Warburg: qual o significado da antiguidade clássica aos homens da Renascença? Saxl afirma que a importância do elemento dionisíaco da antiguidade aos olhos da Renascença foi acentuado um pouco unilateralmente demais por Warburg.

Saxl afirma também que as teorias abstratas são as últimas a serem ilustradas (p. 83). Saxl quer sublinhar a sifnificação histórica dessa nova representação das ligações entre verdade e tempo. Com esforço, podemos perceber o conceito warburgiano de Pathsformeln: as representações dos mitos que a antiguidade deixou como textemunhos de estados de alma que se tornaram imagens; buscados pelas gerações sucessoras como emoções profundas da existência humana.

Interesse de Saxl pela ''aventura do mito antigo e da Verdade revelada peloTempo: uma vez que a representação se encarrega de elementos estrangeiros, puramente explicativos, seu interesse disaparece, ou ao menos é fortemente atenuado'' (idem, p. 85). Desta forma, existe uma forte continuidade entre Warburg e Saxl, ou seja, o tema central da significação da antiguidade clássica dos mitos, das representações, para os homens da Renascença.

IV.

Warburg: rejeição de toda leitura ''impressionista'', estetisante das obras de arte eram rejeitadas. Seu objetivo, conforme Heise, era duplo: a) considerar as obras de arte a partir dos testemunhos históricos, de todos os tipos e niveis que poderiam esclarecer a gênese e a significação; b) a obra de arte ela mesma, e, de maneira mais general, as imagens, deveriam ser interpretadas enquanto fontes sui generis pela reconstrução histórica.

Nessa perspectiva a avaliação puramente estética estava ausente. ''É – ou ao menos deveria ser – incontestável, que mettre em lumière les allusions chachées em um quadro (se elas existem), indicar as alusões à um texto literário (se elas existam), buscar, uma vez que seja possível, conhecer a existência deste ou destes que encomendaram a obra, sua posição social e eventualmente seus gostos artísticos, ajuda a compreender uma obra de arte e facilita uma avaliação mais precisa'' (idem, p.87-8). [é isso que Ginzburg faz no texto sobre Ticiano]

Uma pintura pode ser significativa para o historiedador pois ela testemunha determinadas relações culturais, ou importante para o pesquisador em iconografia, e aomesmo tempo ser isignificante do ponto de vista estético'' (idem, p.88).

Sobre o segundo ponto, é possível compreender uma situação histórica a partir de fontes figurativas e documentárias? (Saxl tem têndencia a privilegiar a análise iconográfica, e não de utilisá-la como instrumento de reconstrução histórica geral. Saxl utilisa seu conhecimento sem nenhuma limitação corportista para resolver problemas circunscritos e precisos, mas, que uma vez resolvidos, entram num contexto maior.

Em ''Holbein e a Reforma'', Saxl quer abordar um problema histórico tomando gravuras e quadros como fontes, estudando-os, na medida do possível, independemente de suas qualidades como bras de arte. O problema histórico seria a posição religiosa de Holbein. ''Comparer une xylographie au compte rendu d'une déclaration orale est un exercice qui comporte des risques, une image étant inévitalement plus ambigue et sujette à des interprétations diverses'' (idem, p. 93). Mas as conclusões de Saxl não são tão convincentes.

Saxl, nesse ensaio, é um exemplar dos riscos ligados ao método. A chave de sua interpretação não é dada pelas obras de arte, mas pela lenda do Hercules Germanicus. Utilização de xilogravuras, documentos de propaganda, panfletos do período da Reforma, não são grandes obras de arte, mas um ''espelho'' [índices?] das atitudes da época.

Sobre a análise de Durer, Saxl quer sair de uma leitura puramente formalista e considerar cada obra como uma reação complexa e ativa aos eventos históricos do momento. Arbitrariedade de considerar os altos e baixos do itinerário religioso de Durer a partir das imagens agitadas ou calmas.

''os inconvenientes de uma tal leitura ''physiognomica'' dos testemunhos figurados são claras. O historiador lê neles aquilo que ele já sabia por outros meios, ou que ele acredita saber e quer demonstrar'' (idem, p. 101, grifos do autor). Isso não é, evidentemente o caso de Saxl, mas ele corre esse risco. Tanto que ele busca emmedalhas e frescos simples dados factuais, o historiador não encontrados nada além de problemas relativamente simples.

Crítica de Ginzburg: a hipótese mais ou menos consciente deste tipo de interpretação é, naturalmente, que as obras de arte constituam uma mina de informações à primeira mão e que podemos interpretá-las sem mediação alguma (aí está todo o problema) da mentalidade e da vida afetiva de uma época que pode ser distante (p.102).

Problema da circularidade: o erasmismod e Holbein e as vicitudes da crise religiosa de Durer, que conhecemos por documentos, são dadas como hipóteses e demonstradas através de análises de testemunhos figurados. É claro que uma análise pode, e deve, recorrer à testemunhos de outros tipos, o problema é determinar a natureza da relação entre ''monumentos'' e ''documentos'', entre ''fontes primárias'' e ''fontes secundárias''.

''Nous voulons simplement direque l'analyse iconographique peut souvent être insuiffisante pour qui veut considérer les oeuvres d'art (et plus généralement les témoignages figurés) comme source historique sui generis'' (idem, p. 104).

V

Senso da distinção estabelecida por Panofsky entre iconografia e iconologia. Para Warburg, uma pesquisa puramente iconográfica não havia sentido. O conceito de Pathosformeln (de Warburg) ligava fortemente, na análise, forma e conteúdo. Essarelação foi aprofundada por Panofsky. Ele demonstrou ''que mesmo nas descrições mais elementares de um quadro os dados de conteúdo e os formais são inextricavelmente ligados'' (idem, p. 106). Indicando a impossibilidade de uma descrição puramente formal, Panofsky demonstra ambiguidade de toda figuração. Mas seu tema era distinto, a justificação teórica de suas próprias pesquisas iconográficas. Demonstra que a descrição supõe uma interpretação.

O conteúdo da obra de arte ''c'est ce que le sujet, involontairement et à son insu, révèle de son propre comportement envers le monde et des principes qui le guident, ce comportement étant, et à n même degré, caractérostoqie de chaque créateur, de chaque époque, de chaque peuple, de chaque communauté culturelle em particulier'' (Panofsky apud Ginzburg, p. 108).

Panofsky recusa tanto as referências à psicologia do artista como à psicologia da época. Perigo de cair num ciclo vicioso, perigo implícito em todas ''explicações'' de fenômenos artísticos que demanda categorias histórico-culturais. Sair deste círculo reintroduzindo a obra em uma visão global dos produtos culturais de uma determinada sociedade. Nota 111: ''ais il est aussi certain qu'une des tãches de la critique d'art est de créer des catégorie valables a priori, qu'omn pourrait em quelque sorte appliquer au phénomène artistique comme critères servant à définir son sens immanent de même qu'on a appliqué au jugement exprimé linguistiquement la catégorie de la causalité comme critère servant à definir l'~etre de ce jugement sur le plan de la théorie de la connaissance'' (p. 111).

Esses Ensaios de iconologia, tiveram grande influência na cultura norte-americana, chegando a criar uma veraddeira moda ''iconológica'' [dicionário: arte de representar figuras alegóricas com seus atributos distintivos; conhecimento destes atributos; estudos da representação na arte]; Panofsky por vezes chegou a deixar de lado diversos aspectos da obra de arte (aspectos iconográficos [dicionário: estudo de diversas representações figuradas de um assunto, conjnto de representações, ilustrações] e estilísticos) que deveriam constituir a tarefa específica do pesquisador em iconologia. Ele está ciente da natureza ''subjetiva e irracional'' da iconologia. Ele percebe os perigos à utilisação da intuição.

Primeiramente , Panofsky tinha escrito que o objeto da iconologia era representar pelos ''principes de base qui révélent l'attitude fondamentale d'une nation, d'une période, d'une classe, d'une conception religieuse ou philosophique, qualifiée inconsciemment par une personalité et condensée dans une oeuvre'' (PANOFSKY apud Ginzburg, p. 116). Na reedição a palavra inconscientemente foi suprimida, reafirmando a intervençaõ de programas racionais e conscientes da atividade artística. Para o Panofsky de 1920, a 'poética'' explícita não poderia explicar de maneira alguma à obrade de arte, sendo um fênomeno paralelo a ela. ''É inutil insistir de novo sobre o fato de que as pesquisas iconográficas são importantes e muito úteis'' (idem, p.117), mas é perigoso quando ela pretende se bastar a ela mesma.

VI.

Gombrich: sua formação e centros de interesse diferem dos de Saxl. Encontramos em seu trabalho, negativamente, uma intensa ligação entre interpretação da arte do passado e cultura artistica do presente. Característica essencial de sua personalidade: preponderância de interesses teóricos, embora rejeite elocubrações abstratas, generalidades. Sua teoria se concretisa a cada nova etapa por ilstrações, por exemplos.

Gombrich chega quase a negar a possibilidade de reconstrução de relações históricas gerais. Coloca em questão a ideia que vem desde Warburg da busca por uma ligação entre o nascimento de uma consciência histórica na renascença e a reinterpretação das formas das artes antigas. ''O único testemunho decisivo será então o documento que mostrará a consciência da analogia entre descoberta da perspectiva linear e nascimento de uma dimensão histórica nesses mesmos homens do Quattocento'' (idem, p.122). Mas é evidente que o historiador estabelece ligações, relações, paralelismo que não são sempre embasados em uma documentação direta.

Por exemplo, sobre a analogia entre o afastamento do realismo na arte medieval como um afastamento do mundo proposto pela philosofia transcedental da época. Gombrich não nega a existência desta mentalidade medieval, mas sim coloca em cheque a facilidade, o automatismo do paralelo, que ele aproximad as generalizações sociológicas de Taine.

Gombrich deve muito a Popper: adoção de sua teoria anti-historicista. Dessa maneira, está incitado a examinar cada obra de arte especificamente, sem se conter com ''explicações'' fáceis e generais e que não explicam nada. Mas essa atitude de Gombrich corre o risco de deixar de lado as correlações entre história e fenômenos artísticos.

Segundo alvo da polêmiac de Gombrich. Ele refusa, de maneira justa, as intepretações em ''uma perspectiva expressionista'' da arte do passado. Problematica de interpretar certas miniaturas medievais de estilo tormentado como se fossem retorções de Van Gogh. É ver um estilo como uma obra em si mesmo. ''Esta deformação anti-histórica se recusa de ver a obra no contexto de convenções estilísticas de sua época'' (idem, p. 127). ele recusa a sobreposição de uma concepção moderna, da arte como ruptura necessária com a tradição e como expressão imediata da individualidade (ou inconsciente do artista), à arte do passado. - Influência tambémd e Freud em Gombrich.

Ele terminou afirmando ''que a obra de arte não deve ser considerada nem como ''sintoma'' nem como ''expressão'' da personalidade do artista, mas como o vetor de uma mensagem particular, podendo ser entendido pelo espectador na medida em que este conhece as alternativas possíves, e o contexto linguistico no interior do qual se situa essa mensagem'' (idem, p. 128). Recusa a iconologia, e não a iconografia, de Panofsky.

Gombrich também se mostra muitoo desconfiado com relação ás tentativas de Warburg e seus discípulos de utilisar as obras de arte como fonte de reconstrução histórica general. Medo de colocar au Zeitgeist de uma época as características fisiognómicas que descobrimos nos estilos artísticos dominantes da época. Gombrich: ''as artes visuais eram a via de acesso mais curta ás mentalidades de civilizações que se tornaram inacessíveis de outras formas'' (idem, p. 133).Ele afirma que Huizinga e Curtius estavam protegidos contra esse perigo.

De maneria semelhante, em sua aula inaugural, Gombrich alerta aos historiadores de arte o perigo de considerar estilos do passado como uma simples expressão de época, raça, ou situação de classe. Entretanto, ele não deixa de notar, é claro, que existe um clima mental, uma atitude que impregna sociedades e períodos históricos, e que a arte e artistas reagem inevitavelmente ás transformações de valores dominantes. Mas os estilos artísticos não fornecem nada além de índices muito problemáticos para as mudanças intelectuais ou sociais. O campo ao qual Gombrich nos levou é mais fechado e árido.

VII.

Diferentemente de fatos estilísticos, os iconográficos são um elemento de mediação sem equívoco entre o meio cultural, religioso e político de uma obra de arte, sem equívoco ou melhor, objetivamente controlável – diziam Waburg e saxl. É aí que Gombrich vê o diferencial do método warborguiano. Mas para Gombrich, se a iconologia não quer se tornar um instrumento inútil, ela deve se colocar o problema perpétuamente atual do estilo nas artes.

VIII

Em arte e ilusão, a sua tese seria impensável sem o aparecimento de uma arte não figurativa. ''Gombrich demonstra, com uma grande riqueza de exemplos e argumentações muito refinadas, que o artista não pode copiar a realidade tal como ela é,ou tal como ele a vê'' (idem, p. 144). Whorf, a linguagem nos serve à precisar os dados de nossa experiência. Imensidão do fluxo de informações que nos é transmitido pelo universo depassa a possibilidade de apreendê-lo num quadro. Estilo aproximado de uma linguagem. ''Não é a reprodução de uma experiência visual, mas a reconstrução de elementos de uma estrutura modelo'' (idem, p. 144). Na construção deste modelo o artista deve estar ciente antes de tudo dos meios colocados à sua disposição.

Teses: a) o artista não pode copiar a realidade sem fazer referência a outros quadros; b) (de certa maneira o inverso da primeira): a leitura de uma imagem não é nunca evidente, mas ambígua.

''A interpretação de um quadro nos obriga a mobilisar nossas lembraças e nossa experiência de sa imagem por tentativasde projeções. Para descobrir obras de arte no mundo visível, nós procedemos inversamente. Uma mobilização de lembranças de quadros nos será necessária, e então colocaremos o motivo em questão nos esforçando para projetar essas lembranças em uma perspectiva visuamente enquadrada'' (Gombrich apud Guizburg, p. 146).

Esses dados psicológicos explicam o fenômeno surpreendente que é a estabildiade dos estilos na arte. A importância das convenções artísticas.

Mas resta a pergunta: Porque então em determinadas épocas da história escolhemos esquemas diferentes comportantdo representações mais ou menos corretas da realidade? Segundo Arheim, a história da arte é justamente uma história da mutação dessas concepções – afirmação inaceitávei por sua generalização que faz perder o objeto essencial dessa história (pinturas, estátuas, edifícios).

Gombrich: ''todos os quadros (...) devem muito mais ao estudo de outros quadros que à observação direta'' (Gombrich apud Guizburg idem, p. 149). Em suma, vimos como gombrich parte da negação de interetações impressionistas, ou seja, que fazem ligações imediatas entre obras de arte e situações históricas ou psicológicas, e acentua a extrema importância da tradição na história de arte. ''representação pictural da realidade se torna possível, literalmente, pela exsitência de outras obras de arte'' (idem, p. 149). tarefa primeira da história da arte é a busca dessas ligações e relações de dependência e oposição que nem as obra de arte.

Assim, de um lado, ganhamos no aprofundamento dos problemas de estilo pictural graças a instrumentos oriundos da psicologia; por outro, perdemos na diminuição das relações existentes entre a realidade histórica e fenómenos artísticos. Gombrich resolveu, em sua pesquisa, o problema crucial da modificação dos estilos.

IX

Em Arte e Ilusão, parece quase a contragosto que Gombrich utilisa o conceitode função: o papel diferente que a arte tem no Egito e na Grécia explica a transformação de estilo. A forma de uma representação não pode se separar da finalidade e exigências da sociedade ou uma vinguagem visual dada e válida. As grandes mudanças do gosto são explicadas pela mudança de exigências, que não parecem nunca ditadas por motivos puramente estéticos.

Mental set: arte como mensagem ou comunicação. Comparável ao telégrafo sem fio. ''do lado da emissão tempos as ''exigências'' (estéticas, mas também políticas, religiosas e assim em diante) emitidas pela socidade ''na qual uma dada linguagem visual é válida''; do lado da recepção temos o mental set, ou seja, segundo a definição de Gombrich, ''as atitudes e attentes que influenciarão nossas percepções e farão que nós estejamos dispostos a ver ou a entender uma coisa e não outra''''.

Então a história, as ligações entre fenômenos artísticos e história política, religiosa, social das mentalidades, evacuado pela porta volta pela janela.

''em posant de nouvelles questions sur le lien entre forme et fonction dans l'art, nous pourrons sans doute susciter de nouveaux contacts avec la sociologie et l'anthropologie. Mais ceci appartient largement au futur'' (GOMBRICH, apud Guizburg, p. 158).

Ticiano, Ovídio e os códigos da representação erótica no século XVI

    1. Citação de uma passagem na qual um homem toma uma pintura lasciva como modelo para seus futuros atos sexuais; passagem depois utilizada por St Agostinho para mostrar os efeitos nefastos deste tipo de pintura: devendo-se evitar na pintura tudo aquilo que incita à concupiscência.

    2. Questões: a) como age a imagem erótica? Resposta varia segundo a representação direta ou indireta do ato sexual; a1) na representação direta: o espectador-jouisseur se identifica com os personagens que fazem o ato, público exclusivamente masculino; a2) na representação indireta, o espectador-jouisseur identifica nas personagens representadas (geralmente mulher nuas) parceiras de uma relação sexual imaginária, papel do voyeur. Há, é claro, variantes intermediárias. Assim, um homem qualquer, um ninguém, se assemelha ao d'us Júpiter [ideia de MITOPRÁXIS de Sahlins);

            b) esse processo psicológico assume formas diversas de acordo com a natureza da relação estabelecida entre realidade do espectador e realidade representada pela imagem erótica. Relação condicionada por códigos culturais e linguísticos, pelos quais a imagem é formulada.

            c) Questão dos códigos adotados pela imagem erótica. O que é uma imagem erótica? ''No senso estrito, é uma imagem que se propõe de maneira deliberada (mesmo se não é exclusiva) de excitar sexualmente o espectador-jouisseur. A definição mais abrangente deve incluir também as imagens que, para além das intenções de seus autores, terminam por ganhar, com o tempo, um valor erótico com relação ao público ou a partes dele.

            d) No século XVI a questão da representação erótica se torna objeto de atenção de parte da hierarquia católica. Ligados a dois fatos, o primeiro não deixando de ser, num certo sentido, um aspecto do segundo: 1) controlar a vida sexual; 2) utilização das imagens para restabelecer a relação perdida ou rompida com as massas de fieis [Braxandall]. Intenção colocada num contexto maior, a polêmica protestante contra as imagens sagradas.

                Para um teólogo como Politi, imagens sagradas e eróticas tinham como denominador comum sua eficácia: umas estimulavam o apetite sexual, outras o pietismo religioso. Endereçadas a destinatários ao menos em parte diferentes. Havia dois circuitos de icônes diferentes; a) o público, grande e socialmente indeferenciado (constituído por státuas, afrescos, tetos e paineis de grandes dimensões: acessíveis a todos; b) circuito privado, circunscrito e socialmente elevado: além dos elementos constitutivos dos primeiros, também por coisas de pequenas dimensões, medalhas, pedras preciosas. Separação entre estes dois circuitos icõnicos nos interessa para pensar as imagens eróticas.

                  As únicas imagens intencionalmente eróticas admitidas no circuito público eram as dos bordeis e tavernas. Contra-reforma: retirar dos olhos do grande público toda imagem que tivesse a menor potencialidade erótica. Mas essas imagens eróticas, que só apereciam em público nos bordéis e tavernas, eram grandemente representadas no circuito privado, reservado à elite, através de um código estilisticamente elevado, o da mitologia clássica, que serviade substrato para a fantasia erótica do século XVI.

                  3. Mas podemos ver uma intencionalidade erótica nos quadros de ticiano? Vários pesquisador influenciados pela iconologia de Panofsky responderam negativamente, buscando símbolos escondidos de caracter filosófico. Antes de tudo: os contemporâneos reagiam aos poemas mitológicos de Ticiano como aos quadros explicitamente eróticos. Existem relatos que mostram que o quadro foi recebido ''eroticamente''. É claro, isso não exclui a possibilidade de encontrar nessas obras também os simbolos e alusões de alta cultura que viam os iconólogos. Mas podemos mesmo demonstrar a existência deste segundo nível?

                  4. Ticiano encontrou em Ovídio, não no orignal, mas na versão em língua vugar de um romance alexandrino, a inspiração da maior parte de seus ''poemas'' mitológicos – quadros que, como vimos, tinham, aos olhos dos contemporâneos, um caracter erótico.

                  Panofski fala da relação entre Ticiano e Ovídio, afirmando que o primeiro sentia-se livre para utilisação de modelos visuais, antigos ou modernos, guardando para si sua independência em relação a uma tradição específica que surgia em torno dele sobre Métamorphoses. Mas podemos demonstrar ao contrário que ele a) não sabia latim; b) que ele leu Métamorphoses; c) inovações com relação a tradução iconográfica relacionada com as tradições em língua vulgar e não do texto de Ovídio. Ele não lia nem latim nem em grego: ele tinha de recorrer à tradução.

                  5. As tradições no século XVI estavem longe de ser fiéis, eram adaptações resumidas ou prolixas

                  6. Texto de Ovídio que teria sugerido a um leitor como Ticiano através da alusão à natureza que imita a arte, essa estrutura arquitetônica singular (quadro: Diane surprese au bain par Actéon). A solução figurativa imaginada por Ticiano é muito próxima da tradução, bem diferente da orginal, de Giovanni Andrea dell'Anguillara, quatro anos antes do acabamento de Actéon. A insistência extraordinária da arquitetura da gruta não poderia não ter chocahdo Ticiano. A importãncia da obra de Anquillara na composição do quadro influencia tanto positivamente como negativamente, a partir dos elementos que ela suprime do latim.

                  7. Caso de Perseu e Andromeda e a dependência aparentemente convincente da hipótese de Panofsky de Ticiano com relação ao texto latino. Mas vejamos a tradução de Nicolò degli Agostini.

                  8. Mesmo no caso de Perseu e Andrômeda, a ligação entre Ticiano e Ovídio passava através de uma tradução. A tradução em língua vulgar de Métamorphoses que Ticiano leu passar por duas, ou talvez três mediações.

                  9. a falta de escrúpulo de Ticiano na utilização de materias disparates é conhecida. Penturas contemporâneas, estátuas antigas, e, nesse caso, ilustrações mais ou menos rudimentares das traduções de Ovídio terminavam reagrupadas em uma linguagem única, pertencente a ele. Demonstramos ao longo do texto, então, que Ticiano, pelo contato que tinha com os textos traduitos, nos dá uma imagem de sua completamente diferente da que tínhamos.

                  Mas qual a relação de tudo isso com o problema das representações eróticas no século XVI? Para responder, teríamos que relembrar da distinção entre os circuitos de imagem público e privado. Mas a difusão das impressões veio para confundir os termos, permitindo a camadas sociais subalternas de entrar em contato com não apenas com a pagina impressa, mas também com imagens.

                  Conjurar sobre o enriquecimento da imaginação erótica provocado pelas imagens de Andromeda nua que ilustrava as traduções de Métamorphoses. Imagens que souberam fecundar a fantasia de Ticiano; conteúdo dessas imagens como índice secundário, mas não negligenciável. Muitos dos livros que chegaram aos nossos dias de hoje, aparecem frequementemente desfigurados pela pluma de leitores que apagavam o cobriam os atributos sexuais masculinos e femininos. ''mostram entretanto que essas imagens não os deixxavam indeferentes. Zelo contra reformista'' (idem, p.211). Mas o que significa essa última expressão.

                  10. Manuais de confessão na Itália entre o fim do séculoXV e o fim do século XVI. Os pecados mais condenados era a avareza e depois a luxúria. Mas em torno dessa data começa o processo de controle minucioso da vida sexual, que temos o hábito de chamar, nos países católicos, de Contra Reforma. Mas por quê surgiram em outros lugares uma forma análoga de controle, também em países protestantes? Tudo pode ser, provavelmente, explicado pelas tensões demográficas que emergiam nas sociedades européias.

                  Mas esses manuais de confissão nos permitem observar também que o pecado da luxúria está relacionado ao tocar e ouvir. A vista não é quase nunca mencionada. Simplesmente pois a difusão das imagens ''sujas'' devia ser mínima ou nula, salvo nas mcamadas superiores da sociedade. É apenas ao logo do século XVI que a vista emerge lentamente como senso erotico privilegiado.

                  ''Il est sûr, en tout cas, que Philippe II ne fut pas seul à projeter, comme le personnage de Térence, ses fantasmes les plus secrets sur les exploits amoureux des dieux antiques; bien des lecture anonymes des traductions des Métamorphoses on dû faire de même'' (idem, p. 214). [parte de um índice individual, para levantar uma hipótese sócio-histórica geral.]



Traces (=índices?): raízes de um paradigma indiciário

Proposição do texto: ''Je me propose de montrer dans les pages suivantes comment est apparu silencieusement, à la fin du XIXe siècle, dans le domaine de sciences humaines, un modèle épistémologique (ou, si l'on préfère, un paradigme) auquel on n'a pas, jusqu'à aujourd'hui, suffisament prêté attention'' (Gizburg, p. 218). Talvez a análise deste paradigma nos ajude a sair da oposição estéril entre ''racionalismo'' e ''irracionalismo''

I.

Em 1874 e 1876 uma revista alemã publica uma série artigos sobre a pintura italiana assinados por um pesquisador russo desconhecido. Esse artigos propunham o estabelecimento de um novo método de compreensão de quadros antigos e gerou reações divergentes e discussões. Foram escritos, na realidade por Giovanni Morelli.

Ele dizia que os museus estavam repletos de quadros cuja autoria era inexata. Para atribuí-los ao verdadeiro autor não deveríamos nos apiar sobre as características mais aparentes do quadro, e, portanto, mais fáceis de imitar. ''Il faut au contraire examiner les détails les plus négligeables et les moins influencés par les caractéristiques propres à l'école à laquelle appartenait le peintre: les lobes des oreilles, les ongles, la forme des doigts des mains et des pieds'' (idem, p. 220). Apesar dos bons resultados, se méotod foi muito criticado, talvez pela segurança ou arrogância com que tinha sido proposta. Ele não se colocava problemas de ordem estética, o que lhe foi inclusive censurado, mas problemas preliminares, de ordem filológica.

  1. Os livros de Morelli, escreve Wind, cheios de orelhas e dedos como traindo a presença do artista se assemelham às digitais que traem o próprio criminoso. Castelnuovo aproxima o método de Morelli ao de Sherlock Holmes (Connan Doyle). ''le connaisseur d'art est comparable au détective qui découvre l'auteur du délit (du tableau) sur le base d'indices imperceptibles pour la plupart des gens'' (idem, p.222-3).

  2. Veremos aqui as implicações desse paralelismo (não podemos excluir que se agitasse de algo a mais do que um simples paralelismo). A ideia de ''peqenos gestos inconscientes'' e ''psicologia moderna'', poderíamos substituir pelo nome de Freud. O próprio Freud escrevendo sobre Morelli: ''je crois que son procédé est étroitement apparenté à la technique de la psychanalyse médicale. Celle-ci aussi est habilitée à devenir les choses secrètes et cachées a partir de traits sous-estimés ou dont on ne tient pas compte, a partir du rebut – des déchets'' (FREUD apud GINZBURG, p. 226). Freud fala da influência intelectual considerável que Morelli exercia sobre ele.

  3. O que significou para o jovem Freud, ainda longe da psicanálise, a leitura de Morelli? ''la proposition d'une méthode d'interprétation basée sur les écarts, sur les faits marginaux, considérés comme révélateurs. Ainsi, des détails habituellement considérés comme sans importance, ou même triviaux et ''bas'', fournissaient la clé pour accéder aux produits les plus élevés de l'espirit humain'' (ginzburg, p. 230). Para Morelli, tais fatos marginais eram reveladores pois constituiam momentos onde o artista, ligado a tradição cultural, se relaxava para abrir espaço à traços puramente individuais. ''ce qui frappe ici c'est l'identification du noyau intime de l'individualité artistique aux éléments soustraits au contrôle de la conscience'' (idem, p. 231).

  4. analogia entre os métodos de Morelli, Holmes e Freud. ''dans les trois cas, des traces même infinitésimales permettent de saisir une réalité plus profonde, impossible à atteindre autrement. Des traces: plus précisément, des symptômes (dans le cas de Freud), des indices (dans le cas de Sherlock Holmes), des signes picturaux (dans le cas de Morelli).

    Como explicar essa tripla analogia? Aparentemente a resposta é simples, os três eram médicos. Nos três casos observamos os modelos da ''semiótica medical'': ''la discipline qui permet de diagnostiquer les maladies naccessibles à l'observation directe basée sur des symptômes superficiels, parfois isignifiants aux yeux du profane'' (idem, p. 233).Mas Ginzburg se afasta da ideia de simples coincidência, ao afirmar que por volta do fim do século XIX começa a se afirmar um paradigma indiciária, fundado precisamente na semiótica, nas ciências humanas. Mas suas raízes eram muito mais antigas.

    II.

    1. Início da arqueológia do pensamento indiciário

    Durante milênios o homem foi um caçador, que aprendeu a classificar pegadas infinitesimais. Gerações e gerações de cassadores enriqueceram e transmitiram esses conhecimentos. Talvez mesmo a ideia de narração tenha surgido de uma experiência de deciframento de pegadas: o primeiro a contar uma história foi o caçador, único capaz de ler coerentemente eventos nos rastros mudos. ''Decifrar'' ou ''ler'' os rastros de animais são metáforas. Diferença central: a adivinhação está relacionada ao futuro enquanto a decifração está relacionada à cassa, au passado. Comportamento cognitivo semelhante: operações intelectuais implicadas (análises, comparações, classificações) formalmente idênticas, embora em contextos sociais distintos. Formas de saber na antgia mesopotâmea relacionadas: ''un comportement orienté vers l'analyse de cas individuels, que l'on ne pouvait reconstruire qu'au travers de traces, de symptômes et d'indices (…). On peut donc parler de paradigme indiciaire ou divinatoire, tourné, selon les formes de savoir, vers le passé, le présent ou le futur'' (idem, p. 246). Sobre o passado, tínhamos a adivinhação no sentido próprio, sobre o passado, presente e futuro, a semiótica médica, tanto o diagnóstico como o prognóstico; sobre o passado, a jurisprudência.

    2. Isso explica a emergência histórica de uma constelação de disciplinasinspiradas por deciframento de signos de diferentes maneira, dos sintomas às escrituras. A passagem para a civilização grega traz uma profunda transformação, como o nascimento de novs disciplinas, como a historiografia e filologia, e a nova autonomia de antigas, como a medicina. O corpo, a linguagem e a história foram submetidos, pela primeira vez, a uma enquete sem a priori, excluindo por princípio a intervenção divina. Nos somos ainda seus herdeiros. Mas o fato de um paradigma indiciário ou semiótico exerça o papel principal é menos evidente.

    3. Cinco século antes de Cristo já surgia uma polêmica que duraria até os dias de hoje, as relações entre o médico e o paciente – mudou apenas os termos. Existência de um paradigma científico baseado na física de Galileu, e que se mostrou muito mais durável do que ela própria. O grupo de disciplinas chamadas indiciárias (incluindo a medicina) não correspondem de alguma maneira aos critérios de cientificidade que podemos deduzir do paradigma de galileu. ''disciplines éminemment qualitatives, qui ont pour objets des cas, des situations et des documents individuels, em tant qu'individuels'' (idem, grifo do autor, p. 250). A ciência de Galileu era muito distinta, podendo ter feito sua a máxima: ''daquilo que é individual não podemos falar''. Por isso a história nunca se tornou uma ciência galileana; ela continua uma ciência social sui generis, irremediavelmente ligada ao concreto.

          Mas essa oposição é muito esquemática. A filologia, e mais precisamente a crítica de textos, constitui um caso atípico: o texto, mesmo que tenha necessidade de um suporte sensível, não se identifica a ele. Essa noção abstrata de texto explica porque a crítica textual, continuando fortemente divinatória, continha nela mesma as potencialidades de desenvolvimento de um rigor científico, que deveria amadurecer ao longo do século XIX. Uma decisão radical a fez pegar em consideração unicamente os traços reprodutíveis do texto.

            Galileu indicou uma orientação anti-antropocêntrica e anti-antropomórfica da ciência, que esta não deveria mais abandonar. ''Il est certain qu'entre le physicien galiléen professionnellment sourd aux sons et insensible aux saveurs et aux odeurs, et le médicin de son époque, qui risquait de diagnostics em tendant l'oreille aux râles des poitrines, em reniflant des selles et em goûtant des urines, le contraste ne pouvait pas être plus grand'' (idem, p. 255).

            4. Ginzburg insinua que entre o olho do clínico e o do sujeito cognoscente há algo a mais do que uma simples coincidência. Fala também da escrita como algo próprio, único e singular.

            5. ''Plus les traits individuels étaient considérés comme pertinents, plus la possibilité d'une connaissance scientifique s'évanouissait'' (idem, p. 265). É claro, a decisão de negligenciar fatos individuais não garante a aplicação de métodos matemáticos e físicos, mas o contrário é verdadeiro.

            6. Chegando a este ponto, dois caminhos diferntes se abriam: a) ou sacrificar o conhecimento do bem individual em nome da generalisação (mais ou menos rigorosa, mais ou menos figurada em linguagem matemática); b) ou buscar elaborar um paradigma diferente, inspirado no conhecimento científico (mas de uma cientificidade que ainda estava por ser definida) do individual. A primeira rota foi seguida pelas ciências naturais e só muito tempo depois pelas humanas. ''Le motif em est évident. La propension à oblitérer les traits individuels d'un objet est directement proportionnelle à la distance émotive de l'observateur'' (idem, p. 265 – lembra SAHLINS, la pensée bourgeoise). Para um arquiteto europeu, as diferenças mínimas entre dois prédios é muito maior do que entre uma tártara e outra etíope. ''la connaissance qui tend à individualiser est toujours anthropocentrique, ethnocentrique et ainsi de suite, dans une perspective de plus em plus limitée'' (idem, p. 266). Objetivo de abrir um animal nunca era ver o que ele tem de singular, mas sim as propriedades comuns.

            7. Dificuldade da medicina atingir o rigor das ciências naturais vinha da impossibilidade de quantificação, que vinha, por sua vez, da presença impossível de eliminar, do qualitativo, do individual, do fato que o olho humano é mais sensível às diferenças, mesmo as mais marginais, entre seres humanos que àquelas existentes entre pedra e folhas. Nas discussões sobre a incertitude da médicina já se encontravam formuladas as futuras contradições epistemlógicas das ciencias humanas.

            8. Conhecimento de determinadas ''ciências'' oriundas da experi~encia: saber que o riso de alguém significa num determinado momento da consulta não figura nos manuais de psicologia. O caso da medicina talvez seja o único no qual a codificação escrita de um saber indiciário deu lugar a um real enriquecimento. ''On assiste à une véritable offensive culturelle de la bourgeoisie qui s'approprie une grande partie du savoir indiciaire et non indiciaire, des artisans et des paysans'' (idem, p. 272): ela codifica e intensifica um gigantesco processo de aculturação sido aberto pela Contra-Reforma. Século XVIII e XIX: Série de reformulações destes saberes antigos em livros, da cusinha e da hidrologia à arte veterinária. ''Pour un nombre toujours croissant de lecteurs, l'accès à des expèriences déterminées se fit, dans une mesure de plus em plus grande, par l'intermédiaire des pages des livres. Le roman procura même à la bourgoisie un substitut et em même temps une reformulation des rites d'initiation – c'est-à-dire, l'accès à l'expérience em général'' (idem, p. 273): é precisamente graças a literatura de imaginação que o paradigma indiciário conheceu neste periodo uma nova a imprevista sorte.

            9. Fábula imemorável dos três irmãos que através de indícios constrõem um animal que eles nunca viram; essa obra chega no ocidente através do acolho de Sercambi. Razões do romance policial são conhecidas, e repousa sobre um modelo cognitivo antigo e moderno. Antiguidade imemorável desde tempos dos caçadores; sua modernidade por exemplo na nova paleontologia: Zadig como um profeta do retrospectivo. ''Quand on ne peut pas reproduire les causes, il ne reste plus qu'à les inférer a partir des effets'' (idem, p. 276).

            III.

            1. Entre o século XVIII e XIX é a Medicina que ganha grande prestígio epistemológico e social. É a ela que se referem implicita ou explicitamente todas as ciências humanas. Marx, por exemplo, fala da ''anatomia da sociedade''. Mas as ciências humanas terminaram por admitir cada vez mais o paradigma indiciário da semiótica, e aqui voltamos para a tríade Morelli-Freud-Conan Doyle.

            2. Temos falado até agora do paradigma indiciário, e seus sintomas, em um senso maior. Chegou a hora de desarticulá-los. Analisar astros, dejetos animias, unhas, pulsações... é uma coisa; analisar escrituras, pinturas ou discursos, outra. A distinção entre natureza (inanimada ou viva) e cultura é fundamental. Morelli, pequenos detalhes materiais que a maior parte dos homens, quando falam ou escrevem, introduzem em seu discurso sem intenção, ou melhor sem se dar conta: aí estava o traço mais certeiro sobre a individualidade do artista. Relação indivíduo e controle do estado: ''précisément à ce moment-là émergeait la tendance, toujours plus nette, à un contrôle qualitatif et minutieux sur la société de la part du pouvoir de l'État, qui utilisait une notion de l'individu fondée elle aussi sur des traits minimes et involontaires'' (idem, p. 280).

            3. ''Toute société ressent le besoin de distinguer ses propres composantes; mais les manières de faire face à ce besoin varient selon les époques et les lieux'' (idem, p.280). Identificação de criminosos: Bertillon queria implesmentar o método antropométrico com o ''retrato falado'' – páginas de orelhas produzidas por Bertillon nos fazem lembrar de Morelli. Purkyne: tema de Leibiniz de que o indivíduo, ser totalmente dominado, tem uma particulridade que podemos encontrar em suas características imperceptíveis e infinitesimais. Galton pode levar a cabo seu projeto por: a) descoberta de um intelectual puro como Purkyne; b) o saber concreto ligado à prática cotidiana da população de Bengala; c) a sagacidade política e administrativa de Sir William Herschel, fiel funcionário da Sua Majestade britânica. Galton homenageia apenas o primeiro e o terceiro. Com a impressão digital, a noção de individualidade se produzia em relação ao estado e a seus órgãos burocráticos e policiais, de maneira que o último habitante do vilarejo mais miserável da Ásia ou Europa poderia, graças às suas impressões digitais, ser reconhecido e controlado.

            4. Mas o mesmo paradigma indiciário que serviu à elaboração de formas de controle social cada vez mais refinadas pode ser um instrumento de dosseminação de uma ideologia que obscurecesse uma estrutura social tão complexa como a do capitalismo acabado. ''si la réalité est opaque, des zones privilégiées existent – traces, indices – qui permettent de la déchiffrer'' (idem, p. 290). Esta ideia, central no paradigma indiciário ou semiótico, influenciou profundamente ás ciências humanas. Por exemplo, a psicanálise, como vimos, para a qual detalhes negligenciáveis poderiam revelar fenômenos profundos. Com a decadência do pensamento sistemático surge a fortuna do pensamento aforístico, de Nietzsche à Adorno. Uma tentativa de formular julgamentos sobre o homem e a sociedade inspirados por sintômas e índices, um homem e uma sociedade que estão doentes, em crise. O maior romance de nosso tempo, à la recherche du temps perdu, é constituido de acordo com um rigoroso paradigma indiciário.

            5. Mas pode um paradigma indiciário ser rigoroso? Ciências humanas pósGalileu: ''ou bien assumer un statut scientifique faible pour arriver à des résultats marquants, ou bien assumer un statut scientifique fort pour arriver à des résultats négligeables'' (idem, p. 292). Só a linguística, uma exceção, que sai do dilema, e se torna modelo para outras disciplinas. Poderiamos falar que este tipo de rigor é não apenas impossível de atingir mas também indesejável; pela necessidade da experiência cotidiana e dos fatos colocados aos olhos do observador. Importância dos elementos imponderáveis. ''Intuition basse'', que não tem nada a ver com a intuição ultrasensível de diversos irracionalismos do século XIX e XX. Esta pelo mundo todo, não tem limites geográficos, históricos, étnicos, sexuais ou de classe. Longe de ser um conhecimento superior, de um pequeno numero de elegidos. ''Elle lie étroitement l'animal homme aux autres espèces animales'' (idem, p. 294).

            Freud, lhomme aux loups et les loups-garous

          1. Talvez o caso clínico mais celebre de Freud, esse do homem aos lobos. Aquele que sonha é um jovem russo proveniente de uma família da grande burguesia, que tinha 27 anos em 1914. Página 334, relato do sonho.

          2. Mito das procissões de mortos é bem espalhado pela Europa, o dos combates noturnos pela ferilidade é bem mais raro. Características xamânicas de váris fuguras do folclore europeu, lobisomem eslavos e bálticos, táltos húngaros, kersniki dalmat~es, mazzeri corsos. Todos esse animais poderiam, periodicamente, em espírito ou sobre forma animal, ingressar nos mundos dos mortos. Seus destinos eram marcados por caracteristicas especiais, como nascer com dentes, (táltos), nascido com coifa [membrana amniótica] ( outros e lobisomens), ou entre os doze dias que separam o Natal da Epifânia (lobisomens).

          3. Paciente era russo, nasceu no dia do Natal e com a coifa. ''entre ces éléments et le rêve enfantin, centré sur l'apparition des loups, il existe une homogénéitpe culturelle évidente'' (idem, p. 337). A intermediária entre o folclore popular russo e o futuro paciente de Freud foi a sua amã de leite, descrita como muito crente e supersticiosa. [Temática Gilberto-Freyriana]. Foi por ela que ele escutou sobre os poderes extraordinários (não necessariamente negativos) de ter nascido com coifa. Um contexto sociocultural específico, marcado pela sua amã, a governanta inglesa,os pais e mestres, seus sonhos não tomaram a rota que teriam tomado três séculos antes. ''Au lieu de devenir un loup-garou, il est devenu un névrosé, au bor de la psychose'' (udem, p, 339).

          4. O paciente de Freud vinha de um meio cultural totalmente distinto do seu. Quando tinha de interpretar os sonhos de seus paciente de Viena, Freud era um mestre em decifrar referências específicas, mesmo literárias. Freud não reconheceu o folclore presnete no sonho de seu paciente. ''Le contexte culturel dont le rêve était isso se voyait ainsi ignoré: ne restait que l'expérience individuelle'' (p. 339). Mas isso não basta para propor uma interpretação alternativa à de Freud

          5. Problemática da ''cena primitiva''. Em 1987 Freud afirma ter descoberto que suas teorias sobre a origem da histeria já tinham sido fundadas séculos antes pelos juízes dos processos de bruxaria. Freud se identificava implicitamente aos juízes – identificação entre o juiz e acusado devido seus traumas de infância, e entre o terapeute e o paciente.

          6. ''cena primitiva'' mais próxima do coito paternal do que da sedução das crianças. Seria uma experiência efetivamente vivida pelo paciente ou uma fantasia retrospectiva. Freud assumia ser essa a questão mais espinhosa da doutrina analítica. Não querendo discutir um capítulo essencial da biografia intelectual de Freud, Ginzburg se pergunta sobre o sentido da reaparição, dezessete anos mais tarde, do termo ''cena primitiva''.

          7. ''la réaparition du terme réactive la théorie de la séduction à l'intérieur de laquelle il avait trouvé sa formulation originaire'' (idem, p. 345). implicações folclóricas dos sonhos do homemaos lobos escapavam de Freud, tal como a relação entre as crenças de origem chamânica nos lobisomens et a imagem do sabbat. Resposta em termos freudianos: ''l'existance d'un noyau sexuel traumatique fut perçue clairement par Freud em 1897 (à propos des confessions de sorcières) et devinée obscurément em 1914 (à propos du rêve de l'homme aux loups (…). Dans les croyances folkloriques touchant au sabbat et aux loups-garous on conserverait donc la mémoire réélaborée de traumatismes sexuels vécus non seulement par les individus mais par l'espéce humaine dans un passé tres reculé'' (idem, p.346). O desacordo com Jung não vinha discordância sobre a existência ou não dessa herança filogenética,mais do papel que ela deveria jogar na estratégia analítica. Para Freud, deveríamos recorrer à filogênese apenas a título de explicação, e depois de esgotar todas as possibilidades de interpretação oferecidas pela ontogênese. Entretanto, a interpretação em termos freudianos que viemos de fazer é inaceitável, por dois motivos: a) pois elas repousam (como as teorias de Jung sobre o inconsciente coletivo) sobre uma hipótese lamarckista totalmente não demonstrada: ''à savoir que les expériences psychologiques et culturelles vécues par nos ancêstres feraient partie de notre bagage culturel'' (idem, p. 347); b) A identificação do núcleo sexual traumático com as crenças ligadas ao sabbat e aos lobisomensé arbitrário.

          8. Tudo isso nos levas às posições de Jung. É sobre o terreno do mito que se determina a ruptura entre Jung e Freud. ''pour Freud la théorie des névroses sert à comprendre le mythe, pour Jung c'est l'inverse (…) Les archétypes identifié par Jung sont le fruit d'une intuition superficielle (et superficiellement ethnocentrique) ; sa théorie de l'inconsciente collectif aggrave le lamarckisme déjà inacceptable de Freud'' (idem, p. 328)

          9. Não buscamos explicar a nevrose do homem aos lobos pelo mito dos lobisomens. Mas não podemos deixar de reparar o conteúdo mítico antiquíssimo nos seus sonhos. ''il ne s'agit pas d'un acrhétype au sens de Jung: l'héritage phylogénétique n'y est pour rien. Les voies sont historiques, identifiables ou plausiblesment conjuecturales'' (idem, p.349). Resumindo o problema: somos nós que pensamos os mitos ou os mitos que nos pensam. Lévi-Strauss respondeu com a segunda alternativa. ''conte l'image hypertrophiée (et em définitive solipsiste) du moi interprétant, aurjoud'hui em vogue, la formule ''les mythes nous pensent'' permet souligner de manière provocatrice l'approximation indéfinie de nos catégories analytiques'' (idem, 350).

            Postfácio: reflexões sobre uma hipótese

            1. Discussão pública sobre essa hipótese.

            2. Spie, em italiano, indices e esppiões. A partir da liberdade permitida pela forma do ensaio pode trabalhar num arco de vários milênios. Era essa hipótese que lhe permitia colocar juntos fenômenos tão heterogêneos.

            3. É devido ao cruzamente entre proposições teóricas e exemplificações históricas que Ginzburg vê o sucesso de seu ensaio. ''J'avais saisi quelque chose qui était dans l'air du temps et que j'avais donné voix à des thèmes diffus et qui reposaient parfois à l'état latent'' (idem, p. 353). Tinha medo de ficar preso a esse esquema. Mas o ''paradigma indiciário'' influenciou seu trabalho de duas manerias. Uma, continuou fazendo a pesquisa assim.

            4. A questão da prova, da série e do caso. Sobre a prova não havia nada quando o ensaio foi publicado, ou seja, sobre os procedimentos formulados historicamente e historicamente negociáveis que permetem de distinguir uma conjectura verdadeira de uma falsa. Livros sobre Piero della Francesca, aproximação serrada entre dados estilísticos e extra-estilísticos. ''avec la diffusion du postmodernisme et de son corollaire historiographique (l'impossibilité répétée de distinguer de maniére rigoureuse entre les récits historique et les fictions), la question de la preuve disparaissait d'un coup de la scène'' (idem,p.355).

            5. A prova estava praticamente ausente do ensaio sobre os índices. A série, por outro lado,m estava bem presente, mas como um fato puro, que não foi submetido à análise. Abordou o método deMoretti sem falar em como seus procedimentos o levaram a constituir tais séries. De um lado, s epreocupava com a construção de uma série fundada sobre dados estilísticos (obras de Piero), pour outro, a construção de mitos e ritos análogos independentemente do seu contexto e fisionomia mais manifestas. Nos dois casos ''il s'agissait de réfléchir sur la notion de ressemblance, em dépassant les donnés de surface pour saisir une donnée profonde. Il me semble aujourd'hui que ce tournant em direction de la morphologie était contenu implicitament dans l'hypothèsedu paradigme indiciaire'' (idem, p. 357).

            Questão da série e do anormal (ou anomalias). Recebera muitas críticas pois teria se fixado em casos anormais, e que não seriam sujeitos à generalizações. ''Certains on lu mon essai sur le paradigme indiciaire comme un éloge du fragment, du détail isolé, de l'anomalie opposée à la série. Rien n'est plus éloigné de mês intentions, omplicites et explicites. À la fin de cet essai je déclarais qu'il était nécessaire de partir de détails apparemment marginaux pour saisir le sens global d'une réalité obscurcie par les brouillards de l'idéologie'' (idem, p. 358). Toda a problemática face à generalização histórica. À Ideia de que ele somente poderia generalizar a partir de casos médios, normais, parece insensata. Ao invés de generalizações, Ginzburg ''proposerais de considérer un individu comme le point d'intersection d'une série d'ensembles différents qui ont chacun des dimensions variables'' (idem, p. 359). Historiador deve partir da hipótese que em cada indivíduo, mesmo o mais anormal, coexistem elementos compartilhados por um número variável de indivíduos.

            6. Questão do caso: Warburg falava que um caso bem escolhido e estudado com profndidade permitia lançar as bases de uma reflexão teórica. Andre Jolles, morfologia literária como origem, distinção entre caso, ilustração e uma norma prática como o exemplo, inspirado em um conceito de caráter general. ''le cas est un récit, la plupart du temps très bref et très dense, qui souligne les contradictions internes d'une norme ou les contradictions entre deux systèmes normatis'' (idem, p. 361). O caso como uma das hipóteses mais promissoras do ''paradigma indiciário''. Caso pode colocar em discussão os paradigmas epistemológicos dominantes.

            7. ''Spie'': l'élément autobiographique. Preocupação com o caso individual vem da esthética de Croce, e em depassar o elemento individual por uma generalização, de Gramsci. Óculos através dos quais ele leu Minima Moralia, Psicopatologia da Vida Cotidiana, Os Reis taumaturgos e os ensaios de Warburg. O grau de fecundidade de uma hipótese ''consiste nas possibilidades que podemos inserir nas subjetividades diferentes, em contextos diferentes, em projetos de pesquisa diferentes'' (idem, p. 364).

1 substantivo feminino
estudo dos ícones ('pinturas', 'representações', 'signos') ou do simbolismo artístico
1 ciência da representação, nas artes, das figuras alegóricas, míticas e emblemáticas, e de seus atributos
2 repertório dessas representações
3 estudo de uma obra ou de um conjunto de obras para interpretação do seu tema e dos seus símbolos como representações alegóricas ou emblemáticas de uma visão filosófica ou moral do mundo
4 estudo, por meio de seus reflexos nas artes, da atitude básica de uma nação, de um período histórico de uma classe social, de uma corrente religiosa ou filosófica etc.
5 ramo das belas-artes que estuda o tratamento dos temas em diversos artistas e épocas

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